Durante anos, o anunciado fim do sinal analógico de TV foi temido
como um strike de boliche na audiência dos canais abertos. Milhões de
espectadores com televisores antigos e sem conversores digitais ficariam
sem TV da noite para o dia.
O apagão analógico em São Paulo está
marcado para esta quarta (29), e de fato é possível que muita gente
perca o acesso à Record, ao SBT e à Rede TV!. Mas, ao contrário do que
se esperava, boa parte desse público já está na era digital faz tempo.
São os assinantes dos pacotes de TV por assinatura.
As três
emissoras citadas exigem remuneração paga pelo fornecimento de seus
sinais digitais, e formaram uma empresa chamada Simba para defender seus
interesses. As operadoras de TV paga, como a Net, a Sky e a Claro,
estão dispostas a pagar muito menos do que é pedido.
Se a Simba
conseguir tudo o que quer, receberá cerca de 15 reais por cada assinante
das operadoras. Mas elas, em contrapartida, oferecem apenas alguns
centavos por assinante, alegando que não podem repassar a conta para o
consumidor. Porque sabem que é suicídio cobrar mais, especialmente num
momento de crise.
A TV por assinatura demorou demais para entrar
no Brasil. Os primeiros canais pagos surgiram apenas na virada da década
de 1980 para 1990, quase uma década depois de se instalarem na
Argentina. O crescimento do mercado aconteceu a conta-gotas. O custo dos
pacotes, a dificuldade do cabeamento, a falta de programação em
português: tudo isto fez com que a TV paga permanecesse um artigo de
luxo por muito tempo.
Até que, em meados da década passada, o setor começou a crescer
bastante, embalado pelos bons ventos da economia. Mas aí veio a
recessão, o que fez com que muitos assinantes cancelassem o serviço.
Para piorar a situação, chegaram ao Brasil as plataformas de streaming
como a Netflix, que oferecem uma programação variadíssima por um preço
muito mais acessível.
O resultado é que o movimento cut the cord
(corte o fio), fenômeno nos Estados Unidos já há alguns anos, ganhou
força também por aqui. Cada vez mais pessoas estão se recusando a pagar
uma quantia exorbitante para ter dezenas de canais a que não assistem
nunca.
Some-se a este cenário a possível saída de Record, SBT e
Rede TV! do cardápio oferecido, e o desastre parece iminente. Juntas, as
três emissoras respondem por cerca de 20% da audiência das operadoras.
Esses canais também perderiam muito com uma ruptura abrupta, mas o
espectador ainda poderia assisti-los porque todos têm o sinal aberto.
Já
a TV paga aproxima-se rapidamente do momento em que todo seu modelo de
negócios será colocado em xeque, e não só no Brasil. É cada vez mais
improvável que, daqui a cinco anos, ele continue do jeito que está.
Porque o consumidor sempre encontrará um jeito de acessar o conteúdo da
maneira mais barata e prática possível, e hoje não é mais isto o que
elas têm a oferecer.
Fonte: http://f5.folha.uol.com.br/colunistas/tonygoes/2017/03/briga-com-record-sbt-e-rede-tv-vem-no-pior-momento-possivel-para-as-operadoras-de-tv-paga.shtml