Basílica de São Pedro neste sábado (2) (Foto: AFP)
Para Antonio Marrazzo, reformar a Cúria é adaptá-la a exigências.
Igreja Católica vive à espera de novo Papa após a renúncia de Bento XVI.
As crises enfrentadas pela Igreja Católica têm sido bastante discutidas
nos últimos dias, com a renúncia do agora Papa Emérito Bento XVI e as
preparações para o conclave que que começará na terça-feira (12) e que
vai eleger um novo pontífice. Reforma da Cúria, vazamento de documentos,
denúncias de corrupção e escândalos de pedofilia, além de outras
condutas sexuais impróprias, estão entre os principais desafios para o
próximo Papa.
Um padre italiano que trabalha próximo à Santa Sé, entretanto, acredita
que o grande problema é outro: conseguir achar a linguagem certa para
se comunicar com os fiéis sem perder o sentido da Igreja.
“O ponto crítico não é explicar para as pessoas a estrutura da Igreja
como função. Isso está escrito, e quem quiser saber pode achar no site
do Vaticano.
O problema nosso hoje é achar uma linguagem que permita que as pessoas
entendam por que Cristo é salvação, por que ele me libera como pessoa. É
essa a grande crise que vivemos hoje”, disse ao G1 o
padre Antonio Marrazzo, um italiano de 60 anos que trabalha como
postulador da causa dos santos para a Congregação dos Redentoristas e,
por isso, vive próximo do Vaticano.
Para ele, todos os problemas enfrentados pela Igreja devem ser vistos
de forma mais simples – a Igreja deve servir os fiéis e estar à
disposição deles, mas sem se transformar, perder o conteúdo ou sua
essência. “O protagonista é Cristo, não os sacerdotes. Nós fazemos
apenas a mediação. Mas para atrairmos mais pessoas, estamos nos
transformando. Perde-se o conteúdo, o que é a essência, o senso do que
fazemos.”
'Mundo vive momento crítico'
Padre Marrazzo lembra que não apenas a Igreja, mas o mundo todo vive um
momento crítico. “Em uma história de 2 mil anos, sempre houve crises.
Não vejo onde está o problema”, explica.
O protagonista é Cristo, não os sacerdotes. Nós fazemos apenas a
mediação. Mas para atrairmos mais pessoas, estamos nos transformando.
Perde-se o conteúdo, o que é a essência, o senso do que fazemos"
Padre Antonio Marrazzo
“São tempos muito mais complexos. Com a globalização, temos acesso a
tudo. Os problemas antes eram menos complexos. Hoje temos situações que
não podem ser previstas. Também temos uma grande variedade de culturas.
No século passado, as culturas eram mais restritas, até geograficamente,
eram mais homogêneas. Hoje, os meios de comunicação permitem que se
conheça, com mais facilidade e em tempo real, o que acontece no mundo
todo.”
A globalização aumenta também o impacto do papel da Igreja e das
declarações dadas por suas principais figuras. “A Igreja hoje não
influencia só seus fiéis, não alcança apenas o mundo católico, mas
também outras religiões. E não só religiões, mas países, situações
políticas”, afirma o padre italiano.
O reconhecimento da necessidade de se comunicar com uma linguagem mais
inteligível aos fiéis é seguida de uma crítica aos próprios católicos,
que muitas vezes veem a Igreja como uma prestadora de serviços, que deve
adaptar-se às suas necessidades, e não se esforçam para se integrarem a
ela.
“Para outras coisas elas [as pessoas] se movem. Se precisam viajar
milhares de quilômetros para visitar um lugar nas férias, elas vão. Para
as outras coisas no nível social, elas se esforçam. Com a Igreja não,
precisamos estar à disposição do modo que lhes agrade mais. Deve estar
disponível na necessidade das pessoas, mas quando é uma necessidade
real. Quando é oportunismo, porque está cômodo a elas, é manipulação.”
Como outros religiosos, padre Marrazzo viu a renúncia de Bento XVI de
maneira positiva, classificando-a como algo profético – e lembrando que o
Papa não sucede a Cristo. “Não se trata de não ser capaz de continuar.
Ele não podia continuar segundo o modo sobre os quais são feitas as
exigências atuais. É um convite a todos nós a termos a consciência de
que no momento em que não possamos mais levar adiante um papel, nós o
passemos à frente. Pelo bem dos outros, porque nosso papel é de
serviço”, afirmou.
“O Papa com a renúncia nos recordou que o limite de cada um de nós esta
dentro de nós mesmos. Ficar velho não é uma doença. É um momento da
vida.”
A globalização aumenta também o impacto do papel da Igreja e das declarações dadas por suas principais figuras
Reforma da Cúria
Em Roma e entre os religiosos de todo o mundo, se fala muito sobre a
reforma da Cúria – muitos cardeais veriam a necessidade de se escolher
um Papa com perfil de pastor, e não administrador, para evitar possíveis
“carreiristas” dentro da Igreja. Para padre Marrazzo, a reforma da
Cúria não se trata de mudar pessoas e sim adaptar o modo como ela
trabalha.
“Se trata de achar um modo para que a Cúria se torne realmente um
serviço. Tornar a estrutura mais funcional, que responda melhor às
necessidades do homem contemporâneo. A Cúria é um serviço, não um
discurso de poder. É preciso ajudar os bispos, e por consequência a
todos os fiéis, a viver no modo mais correto e não de afastar da verdade
de Cristo. Não se trata de mudar as pessoas que estão lá. Mas sim mudar
o modo de servir, ajudar ainda mais os cristãos a viverem esse
percurso”, afirmou.
O padre italiano lembra, ainda que todos os últimos Papas realizaram
alguma mudança. “No nível pastoral, o Papa Bento XVI fez transformações –
eliminando algumas comissões, juntando outras, e criou o Pontifício
Conselho para a Promoção da Nova Evangelização. Todos os Papas
reformaram alguma coisa. Reformar a cúria significar adaptá-la às
exigências.”
Fonte: http://g1.globo.com/mundo/renuncia-sucessao-papa-bento-xvi/noticia/2013/03/problema-da-igreja-e-achar-linguagem-que-alcance-o-povo-diz-padre-italiano.html