A última aparição pública, final da Copa em 2010
Nelson Mandela está no hospital, de novo. Ele tem pneumonia e 94
anos. Boletim do governo sul-africano divulgado no domingo comunica que
as condições do venerável líder melhoram. Quanto a mim, não sei se
Mandela irá morrer em questão de horas, dias ou se irá passar dos 100
anos. Sabemos do inevitável espetáculo macabro inspirado pela longa vida
e a estatura de alguém como ele. Aqui os clichês são obrigatórios:
herói da luta antiapartheid, pai da reconciliação sul-africana e
a figura mais próxima que o mundo tem de santo vivo.
E conhecemos o ritual: editores dão uma polida e atualização nos
obituários, suplementos e documentários. A mesma coisa com os planos M,
de cobertura do funeral, para o qual virá todo mundo, de dignatários a
Oprah Winfrey. Existe a ansiedade sobre como será a África do Sul sem
ele, embora Mandela tenha deixado a presidência em 1999.
A espera e os preparativos do gênero valem também para o octogenário
Fidel Castro, outra figura grande da história, embora sem a grandeza de
Mandela. E, de fato, a indústria Mandela é imensa e antiga. Imagine, em
1997, o jornalista sul-africano Lester Venter publicou o livro”Quando
Mandela Partir”.
Haverá a ocasião oportuna aqui para o balanço mais detalhado (ok, o
obituário) de Mandela, mas é sempre bom antecipar um alerta. Mandela
está na galeria de figuras grandiosas da história, como Mahmata Gandhi e
Martin Luther King, mas eles tiveram morte repentina (assassinatos),
enquanto o venerável sul-africano vai partindo lentamente (Fidel dá umas
aceleradas).
Herdeiros políticos e genéticos de Mandela tiram a lasquinha enquanto
é possível. A última aparição pública de Mandela foi em julho de 2010,
na partida final da Copa do Mundo. No ano anterior, ele fora usado de
forma vergonhosa em um comício eleitoral do governista Congresso
Nacional Africano, do qual será até o fim, e além, um fiel militante.
Mandela, de alguem forma, estará presente nas eleições de 2014, exatos
20 anos depois de sua vitória triunfal como o primeiro presidente negro
da África do Sul.
Tanta manipulação não surpreende. Mesmo máquinas governistas menos
autocráticas e corruptas do que o Congresso Nacional Africano fariam o
mesmo se tivessem alguém como Mandela à disposição. De qualquer modo,
uma pena, assim como este excesso de deslumbramento. Eu mencionei acima
figuras trágicas assassinadas como Gandhi e Luther King. Podemos também
mencionar Abraham Lincoln, o presidente republicano que transcendeu
partidos e é reverenciado por todo mundo (ok, quase todo mundo, afinal
os eleitores de Hollywood não deram o Oscar de melho filme).
Mandela merece muita estátua e estatueta, mas nada de embalsamar ou
canonizar o homem. Ele é super, mas não superhomem. Como já disse,
haverá o momento oportuno (muito em breve ou talvez depois do obituário
de Fidel), para um balanço de Mandela, mas, por ora, fico com a frase de
George Orwell, quando escreveu a resenha de uma biografia de Gandhi em
1949: “Santos sempre devem ser julgados culpados até serem provados
inocentes”.
Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/nova-york/africa-do-sul/esperando-mandela-partir/
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